Em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo no último sábado (14), o jornalista esportivo Juca Kfouri faz uma análise da atual relação entre a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Ministro do Esporte, André Fufuca. Ambas as partes estão de olho na tributação bilionária que a regulamentação das apostas esportivas trará ao país.
Leia a coluna completa abaixo:
Quando o governo federal, no início do ano, anunciou que regulamentaria as apostas esportivas, o pessoal da CBF esfregou as mãos: dinheiro à vista.
Marcou audiência com o Ministério da Fazenda e mostrou as condições: para ceder o direito de imagem, seu, dos clubes e dos atletas, pediu 5% sobre a movimentação financeira total.
Pediu que o dinheiro não fosse considerado público e garantiu que falava em nome de todo o futebol. Que, do valor, 20% ficariam para ela e 80% seriam divididos entre os clubes (a jogadores, nada). A CBF estimava ficar com R$ 1 bilhão por ano.
O valor pedido corresponde a cerca de 40% do faturamento bruto das empresas (diferentemente das loterias federais, que distribuem 30% do bolo em prêmios, as empresas de apostas distribuem algo perto de 88%). Desatino puro.
O dinheiro, impôs o Ministério da Fazenda, teria de ser tratado como recurso público, com todas as exigências legais de transparência.
Só que os clubes, na primeira reunião no ministério, deixaram claro que a CBF falava apenas por si.
Aí o discurso da CBF mudou.
Fazia questão de não receber nenhum centavo.
É que o estatuto da CBF proíbe que a entidade receba verba pública —e não por espírito patriótico, ao contrário; a entidade tem é pavor da fiscalização que verba pública impõe.
Por meses, a CBF, outrora tão poderosa até para emparedar CPIs e receber governadores em audiência, não conseguia acesso ao Ministério do Esporte.
Por mais que o secretário de Futebol, José Luiz Ferrarezi, tentasse servir como embaixador da cartolagem, a então ministra Ana Moser atuava como zagueira, indisposta a fazer o jogo da cartolagem.
O secretário-geral da CBF, Alcino Rocha, não conseguia justificar o alto salário, apesar da experiência de quatro anos no próprio Ministério do Esporte e de um ano e meio na Prefeitura de São Paulo, sempre sob governos do PT.
Quando ia a Brasília, o crachá do presidente da CBF era recebido por políticos, e Ednaldo Rodrigues, que o usa, buscava se aproveitar disso. Com pouco resultado.
Até que chegou o dia 13 de setembro.
Então, a Câmara aprovou o projeto de lei das apostas de cota fixa, sem nenhuma linha de interesse da CBF.
Horas antes, porém, havia tomado posse o novo ministro do Esporte, André Fufuca. Foi amor à primeira vista.
O ministro viu na CBF uma forma de aumentar a importância política e financeira do ministério, turbinado com parte da renda das apostas.
A CBF viu em Fufuca a oportunidade de tentar abocanhar de novo o dinheiro das apostas.
A lista de emendas para a nova etapa da discussão do projeto no Senado mostra que a CBF, além de encontrar senadores para abraçar suas propostas, evidencia quais são elas.
A preocupação da CBF com a regulação das apostas esportivas se resume a arrecadar o máximo. Aleluia!
Manipulação de resultados, vício em jogo, lavagem de dinheiro, nada disso importa.
A proposta é a de que ela e os clubes –ela em nome dos clubes, se possível– negociem diretamente com os operadores, mais ou menos como fazem com as placas de publicidade.
Caminho que ameaça destruir o mercado regulado.
Porque as operadoras não aceitarão ter apenas parte dos times, e não é assim mesmo que funciona no mundo todo.
Mas a CBF não liga para nada a não ser com mais ervanário no cofre.
Como o Ministério do Esporte.