O partido Solidariedade ingressou, na última quarta-feira, 12 de março, com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a exploração de serviços lotéricos e apostas de quota fixa por municípios, noticiou o site Jota.
Segundo a legenda, empresas sem credenciamento junto à Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) têm operado no setor a partir de licitações municipais. O caso, que tramita na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1212 sob a relatoria do ministro Nunes Marques, solicita uma medida liminar para suspender todas as leis municipais que instituíram loterias.
De acordo com o Solidariedade, a proliferação das loterias municipais tem sido usada como brecha por empresas do mercado de apostas para evitar a regulamentação federal. A petição destaca que, em Bodó (RN), por exemplo, a concessão para exploração da atividade custa apenas R$ 5 mil, valor significativamente inferior aos R$ 30 milhões exigidos pelo Ministério da Fazenda para empresas do mesmo segmento operarem nacionalmente.
O Ministério da Fazenda já pediu à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) o bloqueio das 38 bets credenciadas no município, que tem 2 mil habitantes, mas ainda não há informações se isso foi realizado. A ação aponta fortes indícios de que as plataformas de apostas credenciadas no município atuam além de seu território.
Interpretação equivocada
A petição também menciona outras 13 cidades que instituíram suas próprias loterias, entre elas Belo Horizonte (MG), Porto Alegre (RS), Campinas (SP) e Anápolis (GO). O Solidariedade ressalta que muitos municípios passaram a explorar modalidades de apostas sem respaldo da regulamentação federal.
"São entes federativos que, sem autorização da legislação nacional, permitem que cidadãos tenham acesso a jogos de azar, incluindo máquinas caça-níqueis (videoloterias) e plataformas de apostas operadas por empresas sem credenciamento adequado", argumenta o advogado Felipe Botelho Silva Mauad, do escritório Mudrovitsch Advogados, que representa o Solidariedade na ação.
O partido sustenta que os municípios fazem uma interpretação equivocada da decisão do STF, que reconheceu a possibilidade de exploração da atividade econômica pelos estados nos julgamentos das ADPFs 492 e 493 e da ADI 4.986. A legenda frisa que o entendimento não se estende às loterias municipais, apenas às estaduais.
A própria Fazenda já manifestou o mesmo entendimento. "A Constituição Federal e a lei brasileira só permitem a exploração de loterias pela União, nacionalmente, pelos estados e pelo DF, dentro do limite de seus respectivos territórios", afirmou o órgão em nota direcionada neste mês à prefeitura de São Gonçalo (RJ), que visa criar sua loteria municipal.
“A questão vai além da inconstitucionalidade formal na criação dessas loterias. O impacto econômico e regulatório tem desestabilizado a exploração legal da atividade pela União e pelos estados, além de abrir caminho para empresas não autorizadas operarem no país. Diante desse cenário, a atuação do STF se torna imprescindível”, afirma Mauad.
Limites constitucionais
Outro ponto levantado pelo partido é que a exploração dos jogos em ambiente digital acaba ampliando a abrangência das concessões municipais para todo o país, o que contraria a competência da União. Como exemplo, o Solidariedade cita o edital da Loteria de Anápolis, que permite a exploração de jogos online sem restrição territorial.
"Os municípios, na ânsia de aumentar suas receitas a qualquer custo, acabam violando o princípio federativo e ultrapassando os limites das competências constitucionais", pontua a legenda.
Além das questões regulatórias, o Solidariedade também aponta falhas na destinação dos valores arrecadados. A legislação federal prevê que os estados repassem 50% dos recursos das loterias para os municípios. No entanto, ao criarem suas próprias loterias, as cidades recebem tanto essa parcela quanto toda a receita gerada localmente, sem obedecer às regras de distribuição estabelecidas pela União.
"Ao permitir que os municípios acumulem esses recursos, sem repasse aos demais entes federativos, cria-se um desequilíbrio na arrecadação, algo que não ocorre na norma federal", ressalta o partido.
A petição também argumenta que as loterias municipais possuem uma vantagem competitiva desleal, já que operam com menores custos regulatórios e oferecem serviços digitais de alcance nacional. Isso, segundo a legenda, prejudica a atividade econômica das empresas devidamente registradas pelos estados e pela União.
O texto da petição do Solidariedade pode ser lido neste link.