Em audiência na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets no Senado nesta terça-feira, 1º de abril, Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), e a diretora do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Sônia Maria Barros, apontaram que a dependência em apostas compartilha mecanismos com outros vícios, como drogas e comportamentos compulsivos.
Os debatedores explicaram que a liberação de dopamina ao apostar reforça a compulsão e reduz a inibição para decisões arriscadas. O perfil dos apostadores online no Brasil é majoritariamente composto por homens jovens de classes sociais mais baixas, "resultando em graves impactos sociais e familiares", segundo os especialistas.
Divulgado na semana passada, um levantamento do Ministério da Justiça e Segurança Pública sobre a prática de apostas por menores de idade no Brasil aponta que 55% do público entre 14 e 17 anos que faz apostas está suscetível a algum risco ou transtorno relacionado a essa prática (a faixa etária mais vulnerável) - com a proliferação de milhares de sites ilegais sendo vista pelo setor como o principal fator para agravamento do cenário.
Doença
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece a ludopatia como doença, classificada no Brasil pelas CID 10-Z72.6 e CID 10-F63.0. Além disso, há ligação entre jogo patológico e transtornos como depressão e ansiedade, agravados pela influência de publicidade agressiva e redes sociais, explicaram. Vários senadores, incluindo Izalci Lucas (PL-MG), defenderam a regulamentação das campanhas de apostas para mitigar o problema.
"É uma doença. Podem falar o que quiserem, divulgar o que quiserem, defender o que quiserem, mas é uma doença que está se alastrando e prejudicando crianças, adolescentes, adultos, idosos e todos os seus familiares, porque essa é uma dependência que não se restringe a prejudicar a pessoa; ela faz migração de classe social para baixo para famílias inteira", afirmou Geraldo da Silva, segundo a Agência Senado.
O presidente da ABP citou estudo do Instituto Locomotiva, que aponta as principais razões dos apostadores. Ele ressaltou que nenhuma das causas que levam as pessoas a buscar as bets se autojustificam, mas geram cada vez mais a "dependência, endividamento e perdas pessoais, familiares, no trabalho e perdas sociais".
"Cinquenta e três por cento vão lá para ganhar dinheiro. E aí eu repito: ninguém ganha das bets. Não existe nenhuma possibilidade de a pessoa enriquecer através das bets. As bets sempre ganham. Essa ilusão de quebrar a banca não existe. 22% buscam por diversão, lazer e entretenimento; 10%, por emoção e adrenalina; 7%, para passar o tempo; curiosidade, 6%; e aliviar o estresse, 2%", afirmou.
Cultural
Já Barros, do Ministério da Saúde, ressaltou que o jogo é uma prática cultural no Brasil desde o período colonial, mesmo após a sua proibição, em 1941. Segundo ela, apesar de, historicamente, não ser um fenômeno novo, o jogo online, no contexto atual da internet, agrega uma característica bastante peculiar.
Ela destacou que, desde dezembro de 2023, mais de 30 portarias foram publicadas para tratar da regulamentação dos jogos eletrônicos, além de uma portaria que estabelece as diretrizes para o jogo responsável e regulamenta comunicação, publicidade e marketing relacionados às apostas de quota fixa.
"Então, a ideia, nos parece, é promover uma exploração econômica socialmente responsável das apostas, prevenindo e mitigando os riscos associados, como a dependência do problema de saúde mental. Esse processo de aprovação, regulamentação e estabelecimento dessas diretrizes nos interessa na área da saúde porque vai trazendo os problemas decorrentes disso" afirmou, de acordo com a Agência Senado.